Poucos sabem que o hit “La Isla Bonita”, de Madonna, recebeu esse nome de um mecânico mexicano especializado em carros Mercedes Benz. Ou que a gravação original da música “Wanna Be Startin’ Somethin'”, do Michael Jackson, tem uma cuíca no meio. Ou ainda que a batida que serve como base da faixa “Brazilian Rhyme”, do Earth , Wind & Fire, foi feita com duas colheres de cozinha.
O responsável por essas sutis presenças brasileiras em alguns dos principais sucessos da música pop mundial é o percussionista Paulinho da Costa, 66 anos, carioca do Irajá que gravou com mais 900 músicos diferentes, como Lionel Ritchie, Aretha Franklin, Ella Fitzgerald, Elton JOhn, Eric Clapton e Bob Dylan, entre muitos outros.
Muito famoso entre os músicos de todo o mundo, Paulinho, no entanto, é praticamente desconhecido entre o público brasileiro, fato que não incomoda nem um pouco o artista. “É o meu trabalho”, diz ele, que fará uma das raras apresentações no Brasil nos dias 8, 9 e 10 de maio no Sesc Pinheiros, em São Paulo, dentro do projeto “As Margens dos Mares”, com artistas portugueses e africanos.
Entre as canções mundialmente famosas em que Paulinho participou, está nada menos que “We Are the World”, o hino composto por Michael Jackson e Lionel Ritchie que reuniu as principais estrelas do pop em uma campanha de combate à fome na África e completou três décadas neste ano. O percussionista, aliás, foi o único brasileiro a participar do projeto. “Tinha tanta gente famosa lá, que [o maestro responsável pelo arranjo da música] Quincy Jones colocou na entrada do estúdio um cartaz escrito: ‘Deixem o ego do lado de fora'”, lembra o artista, que conversou com UOL por telefone, de Los Angeles, onde mora.
Paulinho vive há mais de 40 anos nos Estados Unidos. Ele viajou pela primeira vez para Los Angeles a convite de outro brasileiro famoso no exterior, o pianista Sergio Mendes, em 1972. Em 1976, ele fez sua primeira gravação, “Love Machine”, do grupo The Miracles, com a lenda do soul Smokey Robinson.
“Eu já participei de inúmeros hits ‘number one’, inclusive esta minha primeira gravação com o Miracles. Alguns artistas passaram a vida gravando músicas e nunca chegaram ao topo. Eu já perdi a conta”, diz, citando “All Night Long”, de Lionel Ritchie, e “(I’ve Had) The Time of My Life”, gravada por Bill Medley e Jennifer Warnes para a trilha sonora do filme “Dirty Dancing”. Em seguida, Paulinho foi trabalhar com o trompetista Dizzy Gillespie, um dos maiores ícones do jazz, e depois com o produtor Norman Granz, um dos principais empresários ligados ao jazz nos EUA. “A partir daí, minha carreira deslanchou”.
Nome da música em troca de foto autografada
Em 1986, Madonna convidou Paulinho da Costa para dar um tempero, ou como ele gosta de dizer, uma “pimentinha latina”, em uma faixa ainda sem título. Deu certo, e ele até foi convidado a participar do videoclipe da música, no qual aparece, logo na primeira cena, tocando bongô. Mas, antes de lançar a canção, Madonna tinha um problema. Ela queria um título latino para a faixa, mas não sabia qual. Por isso pediu uma dica a Paulinho. “Como ela queria um nome latino, liguei para um amigo mexicano, um mecânico que conserta Mercedes. Ele me sugeriu: ‘La Isla Bonita’. Madonna amou. Em troca, meu amigo pediu apenas uma foto autografada, e Madonna assinou na hora”, lembrou Paulinho. “Eu tive uma relação profissional muito próxima com ela”.
Dentre os diversos artistas com os quais Paulinho trabalhou, no entanto, Michael Jackson foi o maior. E a presença do percussionista nos hits do Rei do Pop são muitas. Ele até incluiu uma cuíca brasileira em “Wanna Be Startin’ Somethin'” (ouça prestando bastante atenção entre os 2min23s e os 2min30s da música), herança da época em que morava no Brasil e tocava na ala jovem da bateria da escola de samba Portela. “Eu fiz com a cuíca o mesmo riff que se fazia com a guitarra, e Michael adorou”, revelou o músico que também inseriu uma cabaça metálica em “Billie Jean”. Em sua casa, Paulinho tem quase uma tonelada de instrumentos de percussão vindos do mundo inteiro. “Eu coleciono”.
Feijuca na casa de Quincy Jones
Das recordações que guarda de Michael Jackson, ele lembra quando ajudou a organizar uma feijoada vegetariana na casa de Quincy Jones, preparada pela cozinheira Remi Vale Real, mineira de Curvelo que cozinhava para o Rei do Pop. “Quincy me perguntou quando eu iria fazer um feijão brasileiro para ele. Eu disse que era só marcar. E ele marcou”, lembra. “Quincy adora um churrasquinho também, mas não rolou naquele dia porque Michael não comia carne.” O banquete teve ainda a presença do ator Sidney Poitier e do músico Burt Bacharach. “Mas Michael já tinha comido feijoada outras vezes. Aquela não foi a primeira vez.”
Outra lembrança de Paulinho é de uma visita ao rancho Neverland. “Michael sempre gostou da natureza. Lá no sítio (Neverland), ele se inspirava, subia nas árvores e tinha muitas ideias. Ele tinha um estúdio em casa, onde gravamos algumas coisas.”
“Michael ainda tem muitas músicas guardadas. Ele estava animado e queria voltar para os palcos. É uma pessoa que nunca vou esquecer”.
Em algumas músicas de Michael, é possível ouvir a respiração ofegante do Rei do Pop. O que poucos sabem, porém, é que algumas dessas respirações eram de Paulinho. “Ele gostava disso porque dizia que a máquina não tem sentimento. Ele começou a captar esses detalhes”, lembra. Outra curiosidade é a de que Michael Jackson eventualmente ia até ao banheiro para cantar. “Era para ouvir o eco natural, o mesmo efeito que se faz com o reverb.”
A última vez em que Paulinho conversou com Michael foi um pouco antes de ele começar a produção do show “This Is It”, que não chegou a acontecer e foi mostrado em forma de filme após a morte do astro. “Ele ainda tem muitas músicas guardadas. Michael estava animado e queria voltar para os palcos. Ele é uma pessoa que nunca vou esquecer.
Fonte: UOL