O caminho para a Motown


(...) Às vezes as coisas não corriam bem.

Rebbie: Ás vezes Joe tentava pegar Michael para cantar ou fazer algo que ele não queria e Michael não cooperava. Ele demonstrava resistência algumas vezes, mas depois chegava a conclusão de sua importância para o grupo, por ser vocalista.

No início, Joe ficava furioso com Michael, chegando a espancá-lo. Mas uma surra sempre era improdutiva. Michael estaria muito aborrecido para continuar, então o ensaio era interrompido. Então, Joe tentava uma nova forma de convencimento.

Rebbie: Então ele (Joe) e os irmãos mais velhos passaram a elogiá-lo, jogando com o seu pequeno ego. Às vezes isso funcionava!

Essa era uma das razões para o Michael sonhar em viver num castelo. Foi uma lição para ele e seus irmãos: era preciso sacrifício e disciplina para se realizar um sonho. Eles ainda eram tão jovens.



Solando


Considerando a fascinação dos meus garotos por exóticas criações, não me surpreendi quando um deles encabeçou a lista de sucessos em 1972, com uma canção sobre um rato. A música era “Ben”, trilha sonora de um filme do mesmo título. O cantor era Michael.

“Ben” era a terceira música de Michael como artista solo, na sequência de “Go To Be There” e da regravação da velha canção de Bobby Day, “Rockin’ Robin”. Tinha sido uma ideia de Berry Gordy de que ele e os demais garotos também gravassem individualmente (Jermaine figurou na lista de sucessos adolescentes em 1973 com sua versão individual para “Shep and the Limelites” e em 1961 com “Daddy’s Home”).

Eu sabia que a oportunidade de gravar “Ben” era um sonho que se tornava realidade, para Michael. Não era somente uma bela canção – se você não soubesse que Ben era um rato, nunca imaginaria – mas também, Michael passou a gostar de ratos.

Lembro-me de estar jantando com a família em um restaurante numa noite e assistir Michael pegando migalhas de seu prato e colocando no bolso de sua camisa. “Michael, o que está fazendo?” eu finalmente perguntei a ele.

E no momento que o rato colocou sua cabeça para fora do bolso de Michael, eu obtive a minha resposta.


Michael teve ratos enquanto vivemos em Beverly Hills. Nós vivíamos num terreno que tinha um grande jardim e eu via grandes ratos marrons correndo para os arbustos ao longo do dia. Depois de um tempo, fiquei surpresa ao perceber que os ratos aparentemente mudavam de cor, alguns eram parcialmente brancos, alguns totalmente brancos. Então me dei conta de que Michael estava deixando seus ratos brancos soltos no quintal e eles estavam acasalando com os ratos silvestres.

Eu nunca confrontei Michael sobre o seu projeto de criação, mas quando nos mudamos para a nossa casa de Encino, eu o informei: “Seus ratos não irão com você”.

Paralelamente ao seu gosto por ratos, Michael amava mágica. Quando tinha 12 anos ele gastava todos os seus 3 dólares semanais com truques de mágica.

Ele também amava desenhar e pintar. Dois dos seus temas favoritos era Charlie Chaplin e Mickey Mouse; seus esboços adornavam o seu quarto em nossa casa de Encino.


Como uma criança comum, Michael também tinha os seus medos, o pior deles era estar no avião durante uma tempestade ou quando houvesse raios.

Rebbie: Após o show dos meus irmãos em Memphis, eles deveriam voar para Atlanta. Todos estavam prontos para partir do hotel, mas eles não conseguiam encontrar Michael. Eles procuraram em todos os lugares. Finalmente o acharam – escondido no armário. Ele tinha ouvido o prenúncio de uma tempestade.

Noutra ocasião, Rebbie reviu seus irmãos em Nashville, meses depois. Rebbie havia trazido sua filha de 6 meses, Stacee, já que Joe e os meninos ainda não a haviam conhecido. Michael estava tão encantado para ver sua sobrinha, que ele a retirou de seu berço para brincar com ela... depois ambos prontamente adormeceram.

E por Michael ter agido como uma criança de sua idade por diversas vezes, quando eu o assisti cantando “Ben” na premiação do Oscar em 1973, fui mais uma vez lembrada deste fato: profissionalmente ele tinha uma experiência que transcendia a sua idade.


Eu não poderia imaginar nada mais grandioso do que se apresentar na premiação do Oscar. Aos 14 anos, Michael não parecia estar mais nervoso cantando “Ben” naquela noite do que ele estava quando cantou “Climb Ev’ry Mountain, na escola Garnett, na primeira série.

Ainda mais com o comentário que ele me fez depois da apresentação – já era esperado que “Ben” ganhasse o Oscar de melhor trilha sonora. Parecia um profissional veterano: “Mãe, você notou que o autor de “Ben” não me agradeceu por cantar a música e ajudá-la a se tornar um sucesso? Que ele sequer mencionou o meu nome?”

A idade de 14 foi difícil para Michael. Em 1972 ele assistiu com sentimentos confusos, Tito seguir a tendência de sua irmã mais velha e casar. Em 1975, Jermaine, Jackie e Marlon também se amarraram.
“Uma parte de mim” Michael confessou em Moonwalk, “gostaria que nós continuássemos como éramos – irmãos que eram também melhores amigos...”

Rebbie: Hoje em dia, penso que Michael se ressentiu que seus irmãos tenham casado e saído de casa a fim de ter uma vida independente tanto pessoal quanto profissionalmente. Profissionalmente, Michael não conseguia vislumbrar como efetivamente seus irmãos poderiam constituir um grupo musical sólido, tal como haviam estabelecido, se eles não estariam plenamente focados no Jackson Five, como ele.

Ele não disse isso com estas palavras. Como qualquer adolescente, Michael tinha dificuldade de expressar como ele se sentia, principalmente se suas opiniões fossem causar dissabores e dor. Mas ele fez comentários em algumas ocasiões, que me fazem concluir dessa maneira. Que ele estava perdendo a sua parceria quando os demais irmãos saíram de casa.

E no mesmo período em que Michael se preocupava com seus irmãos e o futuro do Jackson Five, ele estava sofrendo com os costumeiros conflitos da adolescência: um significativo crescimento, a mudança de voz e o desenvolvimento severo da acne. Mas pelo fato de Michael atuar em público, essas alterações foram ampliadas.

A respeito de seu evidente falsete, pessoas tinham-nos dito há anos: “O que vocês irão fazer quando Michael mudar a voz?” Era como se o sucesso do Jackson Five fosse totalmente dependente de seu falsete.

Como se pôde constatar, a voz de Michael não foi tão afetada – os tons altos eram comuns na família – mas a princípio, Michael não queria sequer admitir o fato de que aquilo iria mudar tudo. “Você sabe, Michael não vai querer desistir de sua voz”, La Toya me disse um dia. “Ele deveria (aceitar a mudança), mas vai continuar tentando alcançar um tom mais alto”.

Mas por mais preocupação que ele tivesse acerca de sua voz, nada se compararia a vergonha que ele sentia em função da acne. Diferentemente de Jermaine e Marlon, que encararam a sua acne com mais naturalidade, Michael ficou tão constrangido pelas marcas em seu rosto que ele não queria sair de casa. Quando o fez, manteve sua cabeça baixa. Mesmo quando ele conversava comigo, não conseguia me olhar nos olhos.

Eu estava muito preocupada com ele. Eu o levei a um especialista mas não havia muito o que fazer para ajudar.

A acne de Michael desapareceu eventualmente, mas as mudanças desencadeadas pela doença se tornaram permanentes. Ele já não era um menino espontâneo, que gostasse de sair e travesso. Enquanto ele ocasionalmente, se juntava aos seus irmãos para um jogo de basquete no quintal (“Como pode ser bom nisso se você nunca joga?”, os irmãos sempre perguntavam ao Michael, curiosos), agora tinha se tornado quieto, mais sério e mais solitário.


Eu pude perceber esse novo Michael nas fotografias que ele estava tirando. Enquanto La Toya e eu gostávamos de ir até o alojamento dos animais, Michael preferia ficar ao redor da casa fotografando flores e gotas de orvalho... mergulhado em seu próprio mundo.